Cidade de Salitre enfrenta 11º ano seguido de estiagem

No campo, os agricultores que se empolgaram com as chuvas caídas em janeiro último, amargam os prejuízos decorrentes do 11º período de chuvas abaixo da média
Salitre. Esta pequena cidade, localizada na Região do Cariri-Oeste, divisa com os Estados do Pernambuco e Piauí, sofre há uma década com a escassez de chuva. De acordo com os dados da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), 2005 foi o último ano que choveu acima da média histórica na quadra chuvosa (fevereiro a maio), que é de 663,5 milímetros.
De lá pra cá, a localidade acumula secas intensas acarretando prejuízos na economia agrícola, principal fonte de renda dos quase 17 mil habitantes. O Município se encaminha para o 11º ano de escassez hídrica.
O meteorologista do órgão, Raul Fritz, explica que "o relevo da cidade, somado à localidade, contribui para a escassez de chuva, ainda pior que a enfrentada nas outras regiões do Estado.
O Município é relativamente alto e próximo à Chapada do Araripe, então as chuvas que chegam do Leste, geralmente caem antes, atingindo as cidades de Juazeiro e Crato, por exemplo", acrescenta. Ainda conforme Fritz, para que haja pluviosidade em Salitre, o sistema meteorológico deve ser de alta intensidade. "Se o sistema não for forte, as chuvas vão chegar fracas ou nem chegarão, como vem acontecendo", conclui.
As chuvas que incidem sobre Salitre poderiam ser do tipo orográfica, ou de relevo, uma designação dada à precipitação que ocorre quando uma massa de ar carregada de umidade sobe ao encontrar uma elevação do relevo, como uma montanha. "Mas a cidade pode estar do lado oposto em que a montanha recebe os ventos, dessa forma, fica mais difícil chover", explica Fritz.
Prejuízos
Sem chuva e com os reservatórios em situação crítica, falta água para irrigar a lavoura, sobretudo de mandioca. Com 16 mil hectares de terras plantadas do tubérculo, o Município se destaca como um dos maiores produtores do Ceará. Entretanto, apesar do volume da plantação, as quase 200 casas de farinha colhem os prejuízos da escassez hídrica. O proprietário de uma dessas empresas afirma que a produção caiu cerca de 75% nos últimos anos.
"Por semana, produzíamos 80 mil quilos de farinha. Atualmente, esse número não passa de 20, 25 mil quilos", expõe Joelton José Alencar, 31. A diminuição da produção se reflete no número de empregados. A fábrica, que antes empregava 45 funcionários, hoje se mantém com 13 empregados fixos e outros 17 de acordo com a produção. "Se não tem mandioca para fazer a farinha, temos que cortar os funcionários", lamenta.
De acordo com a presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Salitre, Luzinete Andrade, cerca de 70% da população sobrevive da cultura da mandioca. A área de plantio caiu pela metade, gerando "impactos negativos para toda a cidade". "Salitre depende quase em sua totalidade da agricultura. Se nossa principal fonte de renda está comprometida, todos sofrem, principalmente o comércio", detalhou a sindicalista.
Mais de quatro mil agricultores estão, atualmente, sindicalizados. Do total, cerca de mil famílias dependem exclusivamente da roça de mandioca. "Acredito que estamos carentes de políticas públicas. Não é prudente viver esperando só pela chuva, se ela não vem. Os governos, tanto municipal, estadual e federal, devem dispor de políticas, seja a construção de cisternas, aperfeiçoamento do garantia safra, dentre outros, o que não se pode é deixar a seca destruir o sustento de tantas pessoas ao mesmo tempo", ressalta Luzinete.
Comerciante há 21 anos, José Paiva lamenta a estiagem e diz que há muito tempo o comércio da cidade "está enfraquecido": "A crise aqui chegou muito antes dessa que têm se falado em outros Estados. Há uns cinco ou seis anos não vendemos mais como antigamente. A conta é simples: se a mandioca está em baixa, a cidade toda fica em baixa".
Esperança
A primeira grande chuva no ano ocorreu na última quinta-feira (10). Os 75 milímetros registrados pela Funceme mudaram a rotina de inúmeros agricultores. "Apesar da seca, a gente sem mantém |à espera de uma chuva boa como essa", disse o agricultor João Ires Pereira, 28. Ele e outros produtores amanheceram na lavoura, plantando e torcendo para que as chuvas continuem na região. "Perdemos quase tudo que foi plantado até agora, mas aqui estamos nós, plantando novamente para tentar tirar alguma coisa", acrescenta o agricultor que tira o sustento dos dois filhos e da esposa do plantio de feijão e mandioca.
Além de irrigar a plantação, a chuva age eliminando as pragas que destroem parte da plantação "em questão de um ou dois dias", conforme explica o agricultor João Severino. Segundo ele, boa parte da plantação de mandioca foi consumida pelas lagartas. "Como não compensa usar veneno para matá-las, o jeito é esperar a chuva para afastar as pragas", pontua.
Para amenizar os impactos da seca, muitos produtores de farinha estão comprando a mandioca em outros centros para suprir a falta do produto e não perderem os clientes. "Se não comprar em outros Estados, não consigo fabricar a farinha e o prejuízo acaba sendo maior", explica Joelton, que comercializa o alimento para Estados vizinhos e até mesmo para o norte do Brasil, no Estado do Pará.
O gestor municipal Rondilson Ribeiro reconhece as dificuldades enfrentadas pelos agricultores e antecipa que "estuda a possibilidade de perfuração de 60 poços nas zonas rural e urbana" para amenizar a situação.
A medida, segundo ele, dependeria de recursos federais, que estão sendo prospectados. Outra alternativa citada pelo prefeito é a construção de um parque eólico, "para que a cidade não dependa tanto só da agricultura". Questionado sobre a previsão do projeto, Rondilson também disse que "está em fase de estudo".
Fonte: O Regional - Diário do Nordeste

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